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Improvisões – improvisação intermídia

O projeto Improvisões – improvisação intermídia no Teatro Marília – está no ar, com edital e tudo mais, sendo que as inscrições vão até o dia 30.11.07.

Improvisões é um projeto da Prefeitura de Belo Horizonte, por meio da Fundação Municipal de Cultura/Diretoria de Teatros, com foco na improvisação intermídia e no pensamento criativo. O projeto faz parte da ação Arte Expandida – experimentação nos Teatros Municipais. Em que o projeto inova? Improvisões permite que artistas de meios diversos e heterogêneos possam dialogar, ao vivo, diante do público, sem hierarquia.
São 04 apresentações de improvisação intermídia, realizadas no Teatro Marília. Para cada apresentação são selecionados, mediante edital, 03 artistas ou núcleos de criação (quando se trata de mais de um artista) caracterizados, cada um, como mídia do “corpo”, da “imagem” e do “som”, que irão, a partir disso, compor um Coletivo de Improvisação. Ao todo, participam das quatro apresentações 12 artistas ou núcleos.
Juntamente com as improvisações, são apresentadas performances conceituais, intituladas de Pensamento Disparado, realizadas por pensadores que se dedicam às questões de estética contemporânea.
O artista Marcelo Kraiser, um dos idealiazadores de Improvisões, escreve sobre o projeto:
“Improvisões: olhares e ações que surgem e se voltam para a improvisação inventando relações entre o corpo, a imagem e o som. O que queremos dizer com ‘invenção de relações’ ao invés de falarmos em ‘relações entre as artes’? Simplesmente que o que se improvisa são as relações entre os meios visuais, sonoros, linguagens verbais, artistas e técnicos que ocupam o espaço do teatro dentro e fora da caixa cênica devem ser compreendidas como trajetórias, linhas de ação e pensamento nas quais nada foi determinado com antecedência.
Os meios não são vistos nesse caso como aquilo que já foi catalogado como artes visuais, teatro, dança, performance, crítica e assim por diante e que sentados confortavelmente em seus territórios firmes iriam dialogar uns com os outros. Ao contrário disso, não concebemos os meios como lugares de passagem e nem como suportes, mas lugares muito instáveis, onde não fazem o menor sentido os opostos como teoria e prática, ruptura e continuísmo, antigo e contemporâneo pois neles não existem os controles das instituições do pensamento ou dos mercados das artes. O que não quer dizer um elogio do espontâneo e do vale tudo.
Esse lugar entre, como diz Gilles Deleuze, não é um local onde as coisas se relacionam uma com a outra, ‘ é o lugar onde as coisas adquirem velocidade… uma e outra, riacho sem início nem fim, que rói suas duas margens e adquire velocidade no meio’.”

Interfaces entre a produção editorial e a produção cultural

Estarei na Semana da Produção Editorial e Talentos Editoriais, evento realizado pelo Uni-BH, discutindo a “Gestão de políticas públicas para a cultura – o desenho de projetos culturais: recorte, desenvolvimento e monitoramento – diálogos com a cidade.” Farei uma exposição que terá por base, principalmente, minha experiência na direção do Centro de Cultura Belo Horizonte (1999-2004) e na Diretoria dos Teatros da Fundação Municipal de Cultura de Belo Horizonte (2005-).

A seguir, um texto da Coordenadora do Curso, Ludmilla Skrepchuk:

“O curso de Produção Editorial do Centro Universitário de Belo Horizonte- UNI-BH promoverá entre os dias 02 e 04 de outubro, no Auditório do Espaço de Convívio, do campus Diamantina, a partir das 19h, a Semana de Produção Editorial cujo tema será: “As interfaces entre a produção editorial e a produção cultural”.
O evento tem o intuito de discutir a abrangência das possibilidades de atuação dos produtores editoriais no contexto das produções culturais e das manifestações artísticas, seja na grande indústria cultural ou em eventos e espetáculos alternativos ou subsidiados pelas leis de incentivo à cultura.
Na tentativa de promover a aproximação dos profissionais de produção editorial com as demandas e necessidade dos produtores artísticos e executivos, criando conexões entre o fazer do campo da editoração impressa, eletrônica e digital com a produção e divulgação de espetáculos e produções culturais nas mais diversas áreas: teatro, música, gastronomia, dança, enfim, o encontro da arte com as técnicas, tecnologias e teorias que perpassam o campo de atuação profissional dos produtores editoriais, numa perspectiva de complementariedade entre essas áreas.
Partimos do pressuposto de que nossa ferramenta fundamental é a formatação de produtos midiáticos e que todo e qualquer espetáculo prescinde da mídia para alcançar seu público. Sendo assim, o lugar da arte entrecruza-se com a editoração midiática.”

Instant Composition: Momentum















O projeto Momentum composição no instante – apresentou quatro performances improvisacionais no Teatro Francisco Nunes, nos dias 11, 12, 18 e 19 de setembro de 2007. A curadoria é de Dudude Herrmann, que escolheu, para cada dia, trios de bailarinos/performers que não estavam habituados a trabalharem entre si, para que realizassem composições no instante.

O Projeto da Prefeitura de Belo Horizonte/Fundação Municipal de Cultura/Diretoria de Teatros, faz parte da ação Arte Expandida – experimentação nos Teatros Municipais.

Dudude diz que o projeto é “um exercício pleno de desapego, em que improvisação, dança e composição estão, o tempo todo, se fazendo e desfazendo, em um constante devir de mundaças”. Os bailarinos/performers têm apenas uma tarde para se preparem, estabelecendo protocolos (negociações) de uso do espaço, equipamentos, iluminação, sonoplastia etc. À noite, diante do público, criam uma obra instável e permeada de riscos.

Na primeira noite(dia 11), Momentum apresentou Letícia Carneiro, Lívia Rangel e Lourenço Marques. Esse coletivo instaurou a platéia no palco, em arquibancadas (o que foi utilizado por todos os outros em seguida), definindo um espaço mais intimista (poltrona, mesa, toca discos), utilizando ainda as cordas de marinharia do teatro com suas maleguetas como fundo, a escada que vai para a varanda e urdimento. Houve uma escuta muito atenta entre eles, não só através de suas ações e desenhos corporais (sempre muito sóbrios), mas principalmente de suas musculaturas. Criou-se uma tensão entre os corpos, ocorrendo a construção de uma cena diante do público.

Na noite seguinte (dia 12), Marise Dinis, Margô Assis e Sérgio Penna. Os três partiram de uma série de elementos que solicitariam seus corpos: propostas de ação feitas por pessoas que enviaram mensagens eletrônicas etc. Os três envolveram também a platéia, sendo que algumas pessoas foram convidadas a improvisar com os três. A fragmentação da possível narrativa corpórea foi um dos recursos utilizados pelo grupo: ora um elemento entrava como texto a ser lido, ora uma tilha sonora, sempre produzindo interrupções. Trata-se de uma descontinuidade radical, produzindo cortes de fluxo, procurando, o tempo todo envolver o público como parte da paisagem de dança.

No dia 18, na terceira noite, Izabel Stewart, Carlos Arão e Thembi Rosa utilizaram as duas platéias (as arquibancadas no palco e a platéia de 55o lugares do Teatro Municipal). Utilizaram todo o espaço, com recortes de luz circulares, canhão de luz e sem trilha sonora. Intitularam de “árido, cru e seco” a intervenção/composição na platéia e palco do Teatro. Carlos Arão fez emergir uma corporeidade xamânica, de forte presença impactante, mas muito silenciosa e atenta. Thembi compunha uma partitura proposta inicialmente pelo seu marido, Canário, músico do Grivo. E Izabel, com um vestido imenso, mantinha-se aparecendo e desaparecendo dos focos, utilizando principalmente a platéia mais vazia do fundo do Teatro. Esse grupo explorou bastante o espaço, compondo com uma recusa em criar significações fechadas.

Por fim, no dia 19, Momentum encerra com Heloísa Domingues, Cristina Rangel e Paulo Azevedo. Os três começaram com utilização de objetos, simulando o espaço de uma academia de ginástica. O tema era o zero e seus desdobramentos. Utilizaram, ainda um microfone em cena. No final, uma bela surpresa: fazem entrar em cena um carrinho de pipoca e de algodão doce.

Momentum teve, a cada noite, um debate com o público, formado por artistas de dança e teatro e outros.

Sobre o projeto e os planos que ele instaura e convida a habitar, destaco:

  1. O que está em foco é a composição no instante (instant composition). Nesse procedimento, o que conta é justo a velocidade de compor no aqui-e-agora, diante do público. Um dos caminhos trilhados na dança improvisacional contemporânea exercita-se menos no não programado e mais na tentativa de incorporar a indeterminação, para lembrar John Cage. Aliás, Cage não acreditava em improvisação e, no entanto, a dança como performance improvisacional teve impulso a partir dele.
  2. Nesse procedimento (experimental) não há regras. As regras são inventadas enquanto se joga.
  3. isso não significa que não haja técnica. No entanto, técnica é um agenciamento maquínico (Deleuze e Guattari): desejo.
  4. Os artistas foram escolhidos pela curadora devido às suas habilidades – ou seja, porque dominam técnicas compositivas.
  5. Entre as técnicas de composição no instante, lembro o que chamamos comumente de “capacidade de escuta”. Para um procedimento técnico de criação que não se desenvolve por regras ou improvisação estruturada, esse é, com certeza o elemento mais importante. Alguns coletivos, em Momentum, tiveram em maior ou menor grau a capacidade de escuta. Conversando com Dudude Hermann, que vem estudando há anos procedimentos é técnicas de composição improvisacional em dança, a escuta é um farejar. Lembramos a criança quando brinca: uma faz um movimento, mantendo a sua ação, enquanto “fareja” o outro sem precisar de se relacionar diretamente com ele. Ou seja, sem ficar preso ao outro. Há diálogo físico, sensorial.
  6. Percebi na edição 2007 de Momentum dois tipos de escuta: a que se faz com a musculatura (com o tônus) e aquela que acontece com as imagens.
  7. A escuta é uma estratégia de silêncio. E o que é o silêncio senão um modo de se permitir que algo possa emergir no campo da percepção (emergência de campo)? Novamente, John Cage: o lugar no qual se dá a performance não é determinado (as estratégias de compor com os acasos).

Dudude Herrmann tem realizado um movimento avaliativo que permite focar a performance de dança improvisacional – suas estratégias, como a questão da escuta, seus “buracos” (lugares onde caimos no desespero de ficamos tentanto preencher o vazio) etc. Os artistas participantes têm feito propostas de aprofundar o projeto, de modo que o campo instaurado por Momentum possa produzir novas conexões.

Momentum deixa uma série de indagações. Os debates foram intensos, trazendo um frescor de idéias e sensações. Há uma coisa que tem a ver com um “espírito de época” nisso tudo. Não de modo datado – um movimento parado. Mais do que isso, a energia das pessoas que buscam, na crosta do planeta Terra, estratégias de sobrevivência. A incorporação do precário, do atravessamento (como sugere sempre a curadora Dudude Herrmann), enfim, de uma realidade em puro devir, faz parte desse espírito de época. O blog voltará ao tema.

Referências:

Imagens da Edição 2007 de Momentum: Glênio Campregher –

Para saber mais:


– A coreógrafa, pesquisadora e performer de dança improvisacional, Katie Duck discute no seu site (em inglês) procedimentos técnicos que interessam ao campo. Entre os temas, a distinção entre improvisação por escolha (choice) e por acaso (chance).
– Na Revista eletrônica Polêmica Imagem, n. 20 (Universidade do Estado do Rio de Janeiro), apresento algumas Anotações sobre teatro e experimento.
– Em Belo Horizonte, o Studio Dudude Herrmann realiza sempre cursos e conferências sobre improvisação e dança.
– Conexões entre as linhas de errância do brincar e o plano de experimentação abrem potencialidades. No blog sobe Cultura do Brincar fiz uma postagem intitulada justamente de Linhas de Errância, na abertura.

Fernando Pinheiro Villar analisa uma performance de dança improvisacional. Leia em
Palavras em movimento: Nova Dança 4 e outros trânsitos. In: André Carreira; Fernando Pinheiro Villar; Guiomar de Grammont; Graciela Ravetti; Sara Rojo. (Org.). Mediações performáticas latino-americanas II. Belo Horizonte (MG): FALE/UFMG, 2004, v. 01, p. 145-164.

Trajetórias



Faço breves relatos de alguns encontros & possíveis. Em tempo: a imagem ao lado é do genial Nikola Tesla ao lado do seu mais famoso invento, o Tesla Coil) – uma imagem que sempre me inspira: quietude com o máximo de agitação e eletricidade.

Christina Machado, da Cia de Dança do Palácio das Artes convidou-me para um bate-bola de teatro físico. A Cia percorre ultimamanete as trilhas da experimentação, com foco no bailarino criador. Nos poucos encontros de três sessões, tenho buscado equacionar composição e improvisação. O teatro físico, como entendo: uma conjunção disjuntiva de estados corporais. Passagem das micro-sensações que percorrem o corpo do performer num diálogo (físico) com os outros corpos, objetos, espaço e tempo. Christina Machado busca com o grupo uma dança de fronteiras, como se pode perceber nos espetáculos recentemente encenados. O último trabalho intitula-se Transtorna e versa sobre as cidades, procurando reter sua fugidia realidade, sua fragmentação e partilha desigual. A Cia está se preparando para a próxima montagem, que deve ter a força dos coreógrafos Mário Nascimento e Sandro Borelli. Em Uberlândia (01 e 02/10) realizei uma oficina de improvisação em teatro físico na Escola Livre de Teatro do Grupo Pontapé. Foi muito bom conhecer o trabalho de Rubens e Kátia Bizinotto, que estão à frente do projeto. Os dois têm efetivamente promovido as culturas cênicas na cidade, produzindo e convidando espetáculos, oficinas, cursos permanentes de teatro, além de festivais, encontros etc. Na oficina procurei dar ênfase à clareza da composição corporal, elegendo algumas ferramentas, entre elas os Viewpoints, na trilha de Anne Bogart e Tina Landau, além da criação de seqüências de movimento configurando narrativas. Tiago Gambogi, do Grupo de Teatro Físico f.a.b. The Detonators, parceiro de Margareth Swallow, com sede em Londres, fez-me um convite-desafio: realizar uma consultoria, à distância, sobre o novo projeto de criação. ■ Ricardo Júnior, no seu auto-exílio para estudos cinematográficos na Argentina, convida para que escreva um artigo sobre o seu vídeo Material Bruto, com roteiro dele e de Byron O’Nell e direção de atores de Juliana Saúde. Material Bruto tem atuação da Cia Sapos & Afogados, um núcleo de usuários do sistema de saúde mental. O vídeo ganhou o prêmio do júri no Festival de Curtas de BH em 2007. Por fim, o Olho-de-Corvo volta à pesquisa, num Coletivo de Criação: Vim buscar sua alma (nome provisório que poderá vir a ser definitivo). Trata-se de uma criação que se desdobra em duas etapas: um vídeo em parceria com Byron O’Nell, contando com a participação de Alex de Castro, Davi Pantuzza, Jéssica Azevedo, Paulo Rocha, Naiara Jardim e Sara Vaz. Ricardo Júnior, da Argentina, dialoga com a pesquisa, lançando perguntas, propondo filmes. Aliás, a primeira etapa foi a realização de estudos sobre narrativas cinematográficas que chamo de disjuntivas, e os teatros pós-dramáticos: elegemos prioritariamente Godard, Glauber (assistimos, além destes, muitos outros) e o Teatro de Tadeusz Kantor, Zikzira Physical Theater e DV-8 Physical Theater. Depois passamos a circundar o universo da linguagem e da temática, lendo quadrinhos (Sanctuary entre outros), Cidades Invisíveis de Ítalo Calvino, textos de Deleuze e Foucault e filmes de Tsai Ming Liang e Kar Wai Wong, especialmente recomendados pelo nosso correspondente em Buenos Ayres, Ricardo Júnior. Foi um curso informal, mas muito fecundo, com ênfase nas narrativas disjuntivas. A segunda etapa será uma performance que irá focar a geografia intensiva da cidade, tendo como ponto de partida os elementos acionados no vídeo. Nessa etapa, outros performers e artistas serão convidados a entrar no jogo. O que falta: conseguir um espaço para ensaio, organizar o material e apresentar para uma empresa produtora. E, então, deixar que o delírio e a sobriedade possam entrar num acordo precário.

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Intervenção cênico-urbana: um relato

Relato aqui uma intervenção cênica nos espaços urbanos, com atores sem formação sistemática e acadêmica em teatro.

O relato fala da transformação de um grupo de atores populares, sem formação técnica em artes cênicas, em performers físicos, que utilizaram alguns elementos de improvisação física tanto no ensaio quanto na apresentação. Eles continuaram realizando seus trabalhos, mas se permitiram, num determinado momento, realizar uma performance na rua, completamente fora dos parâmetros com os quais trabalhavam. Quando falo de transformação, falo da mudança de agenciamento cênico espetacular em que eles entraram:

Um grupo de artistas, sem formação técnica e acadêmica na área cênica, iria se apresentar num evento cultural. Trabalhavam nos dias de semana, a maior parte deles, como porteiros de prédios públicos e, nas horas vagas, realizavam shows de palhaços. Apresentavam um esquete, cuja base de atuação era histriônica, com uma presença cênica muito grande, conseguindo segurar a atenção das pessoas na rua: brincavam de fazer entrevistas com uma câmera de papelão, sendo que um deles, um dos mais histriônicos, fazia o papel da jornalista. O público, nas ruas, ficava eletrizado.

Propus a eles que, além dessa cena, realizassem um trabalho completamente diferente do que, até então, vinham fazendo. Sem mais nem menos eles aceitaram. Havia pouco tempo: quatro encontros, uma vez por semana à noite, após os seus horários de trabalho. A proposta consistia em: “cinco homens sentados em cadeiras na calçada de uma rua bem movimentada, por volta das 13 horas, sem fazer nada. Este “sem fazer nada” já era uma estratégia minha para que não contassem com as ações histriônicas, com as interpretações, com os estados emocionais, etc. A situação já falaria por si só, disse a eles, não seria preciso atuar, fingir, representar. Não se pretendia, além disso, construir uma história a partir das caracterizações. Se houvesse uma ficção, disse a eles, estaria antes na cabeça das pessoas que iriam passar pelo local.
Qual foi o procedimento inicial? Treinar em não fazer nada. Posso dizer que grande parte do tempo foi gasto precisamente nisso: não fazer nada. Ora, isso é muito difícil. Principalmente devido à visão que o grupo possuía de teatro, de espetáculo, não diferindo muito da que se encontra em outras esferas, com a diferença de que eles não se sentiam ameaçados (pelos menos não pude perceber isso) e entregavam-se totalmente ao jogo a que se propunham. Deparei-me com excelentes cômicos.

Não havia tempo para exercícios corporais: a composição era imediata – como a situação era minimalista, o tempo era todo nosso. Utilizei, apenas, o exercício de ficar de pé e respirar, sentindo os apoios. Depois, modos de chegar até as cadeiras. Propus que, no início, eles utilizassem seus narizes de palhaço. Depois, eles os tirariam. Mais adiante, trabalhamos com os modos de se levantar e a relação que surgia entre eles. E improvisamos com isso.
O que se pedia: conexão total e máxima entre eles, de modo que, cada movimento, por menor que fosse, afetasse todos. Busquei o patético que se revelava por si só: cinco homens, de roupas sóbrias (calças e paletós simples), sentados em cadeiras idênticas, na calçada de uma rua movimentada: isso já era informação demasiada. O que estava em jogo, portanto: perceber-se, perceber o outro, estabelecer alguns padrões de linha (as cadeiras enfileiradas uma ao lado da outra já proporcionavam isso), atenção plena.

Fomos para a rua. Havia uma estrutura básica, incluindo alguns movimentos em uníssono, sendo que, no meio, as improvisações ocorriam. Em alguns momentos, um deles disparava uma seqüência de movimentos, num misto de coisas criadas anteriormente e inventadas na hora. Havia sim um jogo, mas sem regras determinadas, a não ser a de se perceberem o tempo todo. Uma pequena seqüência coletiva de movimentos, cada um diante de sua cadeira, com ampla visibilidade, foi utilizada, a que eles recorriam por grandes intervalos de tempo. Eram movimentos de aquecimento, pequenos pulos no mesmo lugar, nas quatro direções. O resto era improvisação.

As reações foram colhidas por mim e por algumas pessoas que nos ajudavam. As falas fornecem um sentido de indiscernibilidade, que é justo o que se pretendia.
Dois adolescentes: “Olha velho, você disse que eles são loucos, não são loucos nada… Isso é teatro…” E o outro: “E o que é loucura para você?”
Uma senhora: “Será que eles são evangélicos?” Dois idosos: “Isso é teatro sim, olha lá.” O outro responde: “Mas não é daqui do Brasil não. Eles importaram esses caras aí para fazer isso…”