Os braços são esponjas. O coração. A veia torta. A nau enfim descoberta, Nos olhos se faz sinistra presença. Que tempo e nó serão esses? A porta estava aberta e o sofrimento entrou. Injeção letal Pendurando na parede seu vestido Líquido vítreo. Quem escreve a sentença? Eu? Você? As sombras ou as sobras? As cotidianas migalhas de sonhos esmagados? Aves que migram, Cascos e borrascas, Anjos e tintas magras, Escrevam um bilhete para quem amo. Digam que o amor sobrevive a tudo. A quase tudo. Não demorem, Por um segundo se perde o segundo. Num voo ralando suas plumas num chão de corte, Na mão da sorte, A estrela, No começo da estrada, Está partida E me pede que a guie. Visões são sentimentos pagando pensão ao destino. Vá, escreva logo este bilhete! Não deixe que demore. Os ventos ligeiros levarão esta mensagem Ruflando através da noite. Mas podem as palavras alguma coisa? Marília e Dirceu? Miragens são grades que dão para um mar seco. Como pode a palavra ser língua Enquanto míngua o amor nas trincheiras Do dia a dia?
Tag: Poesia
“A poesia, dizem, é uma questão de palavras. E é verdade, tanto quanto a pintura é uma questão de tinta e o afresco, uma questão de água e ocra. Mas isso está tão longe de ser toda a verdade que soa um tanto simplista quando dito secamente.
A poesia é uma questão de palavras. A poesia consiste em combinar palavras para fazê-las ondular e vibrar e colorir. A poesia é um jogo de imagens. A poesia é a iridescente sugestão de um idéia. A poesia é todas essas coisas e, contudo, é algo mais. […]
A qualidade essencial da poesia consiste em que ela exige um esforço renovado da atenção, e que “descobre” um mundo novo no interior do mundo conhecido. O homem, e os animais, e as flores, vivem todos dentro de um caos estranho e permanentemente revolto. Chamamos cosmo ao caos ao qual nos acostumamos. Chamamos consciência – e mente, e também civilização – ao indizível caos interior de que somos compostos. Mas trata-se, em última instância, do caos, iluminado por visões, ou não iluminado por visões. Exatamente como o arco-íris pode ou não iluminar a tempestade. E, tal como o arco-íris, a visão perece.
Referências:
Do Youtube:
No trecho de um vídeo de Cristina Fonseca (Poetas de Campos e Espaços,
1992), Augusto de Campos faz a leitura, em provençal e português, de
uma estrofe da Canção XIII do trovador Arnaut Daniel e trecho do
Canto XX de Ezra Pound.