Tinha algo em torno de 05 anos de idade, quando se formou em mim um estranho e ambíguo sentimento de Natal. Ocorreu, assim tão cedo, a percepção de que algumas pessoas poderiam não ter um Natal como eu conhecia. Morávamos na rua Grão Pará, em Teófilo Otoni, na segunda metade da década de 1950. A rua dava para a chamada Estrada do Boi, que levava a Nanuque e ao sul da Bahia. Foi ali, no entardecer, que eu vi um homem e uma criança quase da minha idade, ambos carregando um feixe de lenha nas costas. Perguntei alguma coisa para o meu pai, como se precisasse de uma explicação. Lembro-me do seu semblante quando ele me disse mais ou menos assim: aquele homem coloca o filho para trabalhar. Não me lembro de meu pai ter feito referência ao Natal, mas essa imagem ficou colada em outra imagem, dessa vez sonora: a voz do rádio, que cantava a música natalina do grande Assis Valente: “Eu pensei que todo mundo fosse filho de Papai Noel…”
Foi o meu primeiro choque de pobreza. Já fazia parte do meu mundo os paus-de-arara descendo de caminhão aquela Estrada do Boi, fugindo da seca. Mas isso era um cenário fabuloso, que se dissipava ao longe como um caminhão-fantasma sumindo no meio da poeira. Pois eu vivia descalço, como todos os outros meninos, brincando sob o sol tórrido do nordeste mineiro. Então, eu era como os outros. Ou todos eram como eu, não poderia imaginar outra coisa. Porém, ver um menino quase do meu tamanho, carregar um feixe de lenha, sob o comentário de meu pai, foi um golpe duro.