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Blanchot e o cotidiano

“O cotidiano: o que há de mais difícil a descobrir”.

Assim Maurice Blanchot inicia um dos capítulos de A conversa infinita(tradução de João Moura Jr, Editora Escuta, 2007). Somos levados a passear por signos, conceitos e vislumbres desse estado de coisas que chamamos de cotidiano. E o cotidiano, reitera Blanchot ao longo do texto, é aquilo que “não se deixa apanhar”. Por ser o que nos escapa, “ele pertence à insignificância, e o insignificante é sem verdade, sem realidade, sem segredo, mas é talvez também o lugar de toda significação possível”. Blanchot caminha pelas diversas fases do cotidiano, apreendendo nesse movimento suas defasagens: revelações súbitas, iluminações avulsas, contrapontos e contratempos.

Numa primeira acepção, diz Blanchot, o cotidiano é “aquilo que somos em primeiro lugar e o mais frequentemente: no trabalho, no lazer, na vigília, no sono, na rua, no privado da existência”. Então, um movimento seria o de abrir o cotidiano à história, ao Verdadeiro. Lugar da Revolução.

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Jorge Mautner: poética e política do ser

“…Mas a noite é escura/e o caminho é tão longe/que me leva à loucura/andando e dançando/no fio da navalha/eu sou um faquir/um palhaço/e um grande canalha/teu olhar pontiagudo/me crava como punhal/quero saber de tudo, tudo tudo tudo /antes do carnaval…”

Outro dia deparei-me no Youtube com Estrela da Noite, de Jorge Mautner. Uma das mais belas criações desse compositor, cantor, poeta, filósofo  e, como ele mesmo diz, “profeta do Kaos”. Mautner já trabalhava, aqui, a canção longa, quase uma narrativa, que era praticada também por Jorge Ben, Caetano e Gil. Uma ruptura com a música ligeira, introduzindo a duração e, ao mesmo tempo, um caráter mais nômade, abrindo uma série de paisagens.

Caetano Veloso lembra que Maunter foi um precursor do Tropicalismo. O que não deve ser entendido em termos de uma identidade,  de uma semelhança, ou ainda de uma causalidade. Mautner foi precursor do movimento pela singularidade, diferença e intensidade de sua própria trajetória.    

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Um guarda-chuva no caos: D. H. Lawrence

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Imagem: Tomás Rotger

“A poesia, dizem, é uma questão de palavras. E é verdade, tanto quanto a pintura é uma questão de tinta e o afresco, uma questão de água e ocra. Mas isso está tão longe de ser toda a verdade que soa um tanto simplista quando dito secamente.

A poesia é uma questão de palavras. A poesia consiste em combinar palavras para fazê-las ondular e vibrar e colorir. A poesia é um jogo de imagens. A poesia é a iridescente sugestão de um idéia. A poesia é todas essas coisas e, contudo, é algo mais. […]

A qualidade essencial da poesia consiste em que ela exige um esforço renovado da atenção, e que “descobre” um mundo novo no interior do mundo conhecido. O homem, e os animais, e as flores, vivem todos dentro de um caos estranho e permanentemente revolto. Chamamos cosmo ao caos ao qual nos acostumamos. Chamamos consciência – e mente, e também civilização –  ao indizível caos interior de que somos compostos. Mas trata-se, em última instância, do caos, iluminado por visões, ou não iluminado por visões. Exatamente como o arco-íris pode ou não iluminar a tempestade. E, tal como o arco-íris, a visão perece.

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Festival de Performance de Belo Horizonte

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Performer Joseph Beuys (1921-1986): o que interessa não é o narcisismo, mas a ferida narcísica

Começa hoje e vai até o dia 21.08, o Festival de Performance de BH. A cidade nem acabou de assimilar a Mip2, e já temos o bloco de Denise Pedron, Ricardo Garcia e Cia instaurando espaços e tempos. E tome encontros, oficinas, além das próprias performances!

Uma cultura performática vai se disseminando, desse modo, pela cidade. Um novo projeto focalizando a performance art é mais uma janela aberta. Mais oportunidades de participação e mais enfoques sobre o tema. Belo Horizonte, afinal, já tem mais de 3 milhões de habitantes e muitas urbes em variações sem fim.

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A fala errante: Blanchot

tomas-rotger
Imagem de Tomas Rotger

“Devemos, em primeiro lugar, tentar reunir alguns dos traços que a abordagem do espaço literário permitiu-nos reconhecer. Aí, a palavra não é um poder, não é o poder de dizer. Não está disponível, de nada dispomos dela. Nunca é a linguagem que eu falo.  Nela, jamais falo, jamais me dirijo a ti e jamais te interpelo. Todos esses traços são de forma negativa. Mas essa negação somente mascara o fato mais essencial de que, nessa linguagem, tudo retorna à afirmação, que o que nega nela afirma-se. É que  ela fala como ausência. Onde não fala, já fala: quando cessa, persevera. Não é silenciosa porque, precisamente, o silêncio fala-se nela.  O próprio da fala habitual é que ouví-la faz parte de sua natureza. Mas, nesse ponto do espaço literário, a linguagem é sem se ouvir. Daí o risco da função poética. O poeta é aquele que ouve uma linguagem sem entendimento.