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It’s now or never (ou o enterro de Elvis), por Maurício Vasconcelos

http://www.youtube.com/watch?v=QkMVscR5YOo

Numa noite dos anos 70, em Belo Horizonte. Maurício Vasconcelos pegou umas folhas de papel, uma caneta esferográfica vermelha e escreveu um estranho poema em prosa. Foi num ato só, quase escrita automática. Escrevia e ria. Depois, nem falamos mais nisso, numa época em que era mais importante correr à rua para ver o mundo ocidental-cristão desabar. Os anos se passaram, eu perdi muitas coisas, muitos livros, muitas revistas e jornais que colecionava, um monte de fotografias que tirava. A cada mudança de casa, um mundo lá se ia embora. Curiosamente, alguns escritos não se perderam. Entre eles, dois textos desse bardo-filósofo que vive recluso no interior de Minas. Já publiquei um verso dele, sem autorização. Outro dia achei este escrito. Vale a pena ler: é uma preciosidade. Será que você percebe a mitologia que fervia na cabeça genial de um jovem, atravessada pela vidência de uma lâmina fria?

“O enterro de Elvis levou mocinhas a chorar e o desfile frente ao caixão era igual à fila de ônibus, bem maior do que às 6 horas da tarde. O que elas querem, todos os que ajudam a carregar tal peso, o esqueleto. O esquife escapuliu. Elvis cantando. A ressurreição. Não se importem se já voltam mais.  Vou até lá. Marilyn, que somos amigos de tão fiéis barbitúricos. Estamos mortos, graças a Deus. 

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Signos de um carnaval

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 Carnaval no Rio de Janeiro, nos anos 70. Nós éramos três jovens mineiros que mal chegavam aos 20 anos de idade.   Estávamos em plena ditadura militar, com a distensão anunciada de Geisel. Mesmo assim, não se vislumbrava alternativa, a não ser nas tentativas da oposição permitida e, quase sempre, retórica. E, no entanto, havia uma resistência, presente na irreverência e alegria de nosso povo.  Aliás, alguns diziam que se a Capital Federal ainda fosse o Rio, o golpe militar teria falhado.

Curtíamos o carnaval de nossas pequenas cidades interioranas. Aquele lusco fusco, aquela melancolia e alegria de veias pesadas de minério, sem falar nos outros recantos, beiras de rio e muito mais. Mas, de fato, era a cidade de São Sebastião do Rio de Janeiro, com toda sua história e exuberância. E era para lá que nos dirigíamos. 

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Achados e perdidos

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Você já viu Quadrinhos com trilha sonora? Pois  então, é o caso de Achados e Perdidos. Você lê, vê e ouve. E o trabalho é cativante. Por vários motivos. Como criação de quadrinhos, é puro cinema. Quero dizer que as imagens sequenciais fluem com cortes cinematográficos.

Talvez esteja dizendo uma grande bobagem. Ou uma redundância, dado que são artes sequenciais. Mas como apaixonado pelo cinema, posso afirmar que há, ainda, uma coisa de tempo em Achados e Perdidos. O tempo de cada imagem que vale por si. E a qualidade e delicadeza desse trabalho, como desenhos, trilha, texto e roteiro pegam a gente de cara. Outra coisa que me chama a atenção: a história não vive apenas de peripécia, mas de encontros que modificam nossas percepções sobre as coisas do vivido. Depois de instaurado o problema inicial e, aparentemente agregando ocorrências, o roteiro vai nos conduzindo para uma surpresa: um encontro familiar que é, ao mesmo tempo, não familiar. Não como “reconhecimento” clássico, mas pelo contrário, como reverso de um sentimento já previamente configurado.

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Espaço público, por Vitto Aconcci

WaterPark City, Toronto – Instalação de Vitto Aconcci

 

“Um museu é um lugar público, mas apenas para aqueles que decidiram ser público de museus. Um museu é um espaço público simulado; é autodirecionado, unilateralmente funcional, enquanto que um espaço público real é multidirecional e funcional em sua totalidade. Quando você vai a uma estação de trem, você vai pegar um trem, porém, enquanto isso, você pode visitar uma loja, ou tomar uma bebida em um bar, ou sentar-se em um salão. Por outro lado, quando você vai a um museu, tudo o que está fazendo é ir a um museu. E para ir ao museu você tem que ser um frequentador de museus; você vai a um museu com o objetivo de  ser um frequentador de museus.    

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Ativistas ou bacantes?


Parecia  uma ação típica do Reclaim the streets (imagem acima), quando manifestantes ocupam as ruas não para um protesto clássico, mas para realizar o direito à cidade.  Uma rua do centro da cidade foi invadida de repente, sem qualquer autorização prévia, por dezenas de mulheres que vestiam uma camisa listrada, tipo de presidiário, com um short preto. No peito, a numeração num retângulo branco.  E vinham batendo no chão com um enorme e oco canudo metálico em cada mão, como se fossem baquetas. E de fato, ali estava uma estranha bateria. A imagem e a sonoridade (um pouco estridente) eram muito poderosas. Curioso que tudo estava em preto e branco. Não havia cor.

Porém, mais curioso ainda é que era na época do natal. Então, apareceu um monte de policiais e as bacantes-manifestantes foram empurradas às paredes e postes, sendo exigido de cada uma que apresentassem documentos. Não sei se foram presas. Mas a prensa foi muito forte. Os policiais eram civis. Estavam à paisana. Tinham todo um ar de milícia fascista. Uma espécie de tropa de elite do prefeito.