De Clésio Luiz S. Júnior, sobre a performance Entre Contensões:
“Há algum tempo venho me interessando e intensificando pesquisas em
Grotowski. Pude conhecer o Zikzira e acabei por encontrar o seu blog, que aliás tem ótimo conteúdo e dicas acerca da arte do ator nas suas mais diversas vertentes, e acabei me associando a ele [por isso recebi seu artigo].Também fui conferir o Eduardo Fukushima – e me aproximar da Zikzira para fomentar minhas pesquisas – e de fato, o trabalho dele é bastante peculiar no que diz respeito à dança. As ações físicas são uma prática no teatro, já a precisão de uma partitura ou uma sequência de movimentos precisos pouco se vê nesse mesmo teatro.
O interessante em Fukushima é que sua partitura de ações físicas conta com uma expressividade lotada de signos e é isto que faz a diferença em sua dança, mais do que ritmo e movimento, a dança de Fukushima é rica de gestos e significados.
Ouvir Eduardo, Helena, Zikzira e a platéia alimentou ainda mais as idéias e sensações daquela noite. No que diz respeito ao seu comentário sobre “religião” tendo a endossá-lo. Há, de fato, no trabalho de criação do ator/bailarino, do artista de modo geral [artista no sentido puro da palavra], uma relação imaterial e de transcendência ou, pelo menos, de uma metafísica da interioridade que coloca o sujeito artista em convergência com seu ego, com seu eu, tornando a consciência de si e do mundo um tanto mais aguçada.”
No Zikzira Espaço Ação, pude assistir à dança-performance de Eduardo Fukushima, seguida de debate com ele, Helena Katz e público.
Por que chamo de dança-performance? Porque já é uma dança outra: os movimentos são contidos, com alguns deslocamentos em linha, onde atuam gestos e forças. Falo de uma dança outra porque se trata de pura singularidade. Não se parece com nada.
De minha parte, digo que a performance/dança de Eduardo me retira de todos os lugares convencionais do que se chama dança. De sua expressividade idealizada, dos movimentos que começam sempre pelas pontas e envolvem articulações etc. Daquilo que eu sei – por hábito, por memória – isto é dança!
Fernanda Lippi e André Semenza do Zikzira Teatro Físico, falaram do projeto Solilóquio: das actions de Grotowski, mas que, diferente dele que buscava a Arte como veículo, seriam realizadas diante do público. O Zikzira proporciona, assim, as trilhas para algo que já não é mais dança, que já não é mais teatro…
Helena Katz fez observações e perguntas diretas a Eduardo, a respeito do seu processo de criação. Ele contou-nos um pouco de sua história, dos seus procedimentos criativos, do seu processo de trabalho. Uma história que é uma vida, com seus traços e embates. Helena Katz falou de algo que me chamou muito a atenção: sobre as informações conectadas por hábito, como ocorre não só nos movimentos cotidianos mas, também, no universo da dança, e que Eduardo Fukushima subverte tão bem.
No meio das discussões que acabariam por remeter tais expressividades a um universo pessoal, Marcelo Kraiser, na platéia, lembrou que a arte levava antes a um impessoal. Eduardo cria uma paisagem que pertence somente a ele, sem ser contudo, justamente, da ordem do pessoal.
O que eu vejo na criação de Eduardo Fukushima: se todas as religiões do mundo acabassem – e já acabaram, apenas que elas não sabem disso – ele teria inventado uma: a sua dança. Mas essa seria uma religião que não serviria para ninguém. Somente para ele. E é uma coisa do deserto. Algo do maravilhoso.