Clowns, Fellini e o teatro físico

Ao ver I Clowns de Fellini (traduzido por Palhaços, na distribuição em dvd pela Mais Filmes), pude perceber influências do circo no teatro físico.

Lúcia Romano, no livro Teatro do corpo manifesto: teatro fisico (Perspectiva, 2005), aborda a recuperação das ditas artes menores, como o cabaré e o circo. Nem seria necessário dizer da imensa poesia corporal e cênica que os clowns realizam. O filme é um misto de documentário e ficção, com Fellini e sua equipe vasculhando lembranças e traços de expressão da maravilhosa arte do clown. Fellini explora, ainda, relações entre essas figuras e personagens bizarras e estranhas que povoaram sua infância. A passagem de uma sensação (os clowns ou palhaços do circo) a outra ( sua lembrança dos personagens cotidianos) é que cria o meio intensivo.

Algumas anotações que faço:

1. As variáveis abertas no jogo entre palhaços, desconcertando tudo, abrindo vertentes poéticas inusitadas no que tange às narrativas;

2. O design tanto físico-corporal quanto dos figurinos;

3. O caráter espetacular e de show de variedades – podemos invocar também a montagem de atrações de que fala Eisenstein, quando de seu diálogo com o teatro de Meyerhold;

4. A performance não matriciada, para lembrar Michael Kirby, na sua análise do Happening, diferenciando-a do teatro dramático (que seria uma performance matriciada). Na performance não matriciada, não se dá a estrutura informativa própria do teatro (dramático), na qual uma personagem ou uma ação é construída no plano da significação e da causalidade. Ocorre, antes, a instauração de uma estrutura compartimentada: os elementos da composição não dependem uns dos outros para gerar significação, tal como ocorre no Happening. Desse modo, a estrutura compartimentada traçaria, segundo Kirby, um plano de ocorrências simultânease não conectadas por causalidade. No filme, a cena final é um exemplo de puro delírio e caos.

Referências:
KIRBY, Michael.The new theatre. In SANDFORD, Mariellen R. (Editor), Happenings and Other Acts, London/New York: Routledge, 1994.
ROMANO, Lúcia. O teatro do corpo manifesto: teatro físico. São Paulo: Perspectiva-
Fapesp, 2005.
LAW, Alma and GORDON, Mel. Meyerhold, Eisenstein and biomechanics: actor
training in revolucionary Russia. North Carolina and London: McFarland &
Company, 1996.

Por Luiz Carlos Garrocho

Um aprendiz do sensível. Professor, pesquisador e diretor de teatro. Filósofo.

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